quarta-feira, 24 de maio de 2006

América Latina vive sob sombrio reinado da máfia

A recente onda de violência em São Paulo foi apenas uma mostra, a “ponta do iceberg”, afirma a revista alemã Der Spiegel. Por toda a América Latina, os governos estão capitulando diante dos gângsteres.

O repórter Jens Glusing descreve uma visita à favela de Vigário Geral, apresentada como “uma das mais perigosas do Rio de Janeiro”. A entrada está bloqueada por contêineres de recolhimento de lixo. Ao perceberem a aproximação de um estranho, dois jovens armados de metralhadoras conferem sua identidade e o levam até a igreja.

Lá dentro, diz a revista, as operações policiais são raras e os traficantes de drogas contam que costumam ser avisados com antecedência. Estas gangues paramilitares controlam as 700 favelas do Rio. Elas decidem se a companhia de energia elétrica pode instalar novos cabos, a que horas as lojas e escolas devem fechar, e quem pode visitar a igreja. São governos paralelos, como nas prisões de São Paulo, nas favelas de Caracas e Medelim, e nas ruas de Acapulco e na Cidade do México.

Para Der Spiegel, todo o continente marcha para trás. Gangues de seqüestradores semeiam o terror em Caracas e na Cidade do México. Em El Salvador, na Guatemala e em Honduras, as gangues adolescentes chamadas de Maras vivem de extorsão e seqüestro. Na Colômbia, os paramilitares de direita e as guerrilhas de esquerda sobrevivem do tráfico de drogas e de seqüestros.

“O crime organizado só sobrevive na impunidade”, disse à revista alemã a socióloga Alba Zaluar, “então cria seus próprios territórios para garantir que não será punida dentro deles”.

Mais trágico ainda é o diagnóstico da revista: “As democracias da América Latina, freqüentemente decrépitas, são presas fáceis. O sistema judicial mal funciona na maioria dos países; a policia é freqüentemente corrupta e coopera com traficantes de drogas. Muitos políticos são facilmente subornadas e os mandatos parlamentares são vistos como oportunidades para enriquecimento rápido”.

Depois de várias noites de terror em São Paulo, acrescenta Der Spiegel, o governo capitulou. Enviou emissários à prisão onde estava o líder do Primeiro Comando da Capital, que se auto-intutula o Partido do Crime.

Nestes tristes trópicos, as máfias não têm problemas para recrutar novos voluntários entre os milhões de jovens desempregados. A romantização do crime transforma chefões como Pablo Escobar, do Cartel de Medelim, ou Fernandinho Beira-Mar em heróis da periferia.

As prisões superpovoadas converteram-se em escolas do crime. São bases importantes do poder das gangues.

Na opinião da revista, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenta a reeleição como líder de um país estável que cresce para se tornar uma potência industrial. Mas antigos fantasmas como a violência e a corrupção assombram o país.

O caos em São Paulo já faz empresas estrangeiras repensarem seus investimentos no Brasil.

Der Spiegel acredita que uma vítima da violência pode ser a guinada da América Latina para a esquerda. Na Colômbia, Álvaro Uribe deve ser reeleito no primeiro turno no próximo domingo, 28 de maio, com uma política linha-dura no combate à guerrilha. No México, o candidato conservador Felipe Calderón já ameaça a liderança do esquerdista Andrés Manuel López Obrador para a eleição presidencial de 2 de julho.

Até mesmo Hugo Chávez, o histriônico presidente da Venezuela, estaria ameaçado. Caracas é hoje a cidade mais violenta do subcontinente. A taxa de homicídios triplicou desde a vitória de Chávez em 1998.

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