domingo, 28 de maio de 2006

Situação da América Latina é melhor do que parece

Os últimos meses foram muito ruins para a imagem da América Latina. Mas as perspectivas para a região são mais favoráveis do que parecem, afirma o economista Victor Bulmer-Thomas, diretor do Royal Institute of International Affairs, a Chatham House, em Londres.

Em artigo no jornal Financial Times, ele enumera os problemas:
• A ALCA (Área de Livre Comércio das Américas) foi rejeitada na 4ª Reunião de Cúpula das Américas, em Mar del Plata, na Argentina, em março.
• A reunião de cúpula foi prejudicada pelas discussões públicas entre os presidentes da Argentina, Nestor Kirchner, e do México, Vicente Fox, e entre Fox e o presidente da Venezuela, Hugo Chávez.
• Chávez usou seu poder na Venezuela para obrigar as companhias de petróleo a renegociar seus contratos em condições draconianas (dando 60% de participação à estatal Petróleos de Venezuela, a PdVSA).
• Depois de uma reunião de cúpula em Havana com Chávez e o líder cubano Fidel Castro, o novo presidente da Bolívia, Evo Morales, nacionalizou o petróleo e o gás, enviou tropas para ocupar as instalações das empresas estrangeiras e ameaçou não pagar qualquer compensação.
• Para não ficar para trás, o Equador cancelou em maio o contrato de exploração de petróleo da Occidental Petroleum.
• No Brasil, a violência irrompeu nas ruas de São Paulo, provocando mais de 150 mortes.

Esta série de problemas reforça os velhos estereótipos sobre a região, comenta o professor Bulmer-Thomas. Mas “depois de cinco anos de estagnação a partir de 1998, as economias latino-americanas tiveram crescimento saudável nos últimos anos e a tendência é que isto continue”.

O crescimento acontece com inflação baixa, saldos positivos de conta corrente e uma queda na razão dívida externa/produto interno bruto. Ao mesmo tempo, a pobreza absoluta diminui.

No plano político, observa o diretor do RIIA, a América Latina passa por um ciclo eleitoral em que os votos são arduamente disputados, os resultados difíceis de prever, e as transições pacíficas e democráticas. O apoio à democracia, que Bulmer-Thomas distingue da satisfação com ela, é elevado, segundo o instituto independente Latinobarómetro.

O panorama econômico internacional favorável – com juros baixos na maioria dos paises, rápido crescimento do comércio internacional e alta nos preços das commodities (produtos primários) – ajudou muito nos últimos anos. Mas o período anterior, de cinco anos de estagnação, deslocou o pêndulo político regional para a esquerda.

Além disso, o descaso dos Estados Unidos com a região depois dos atentados de 11 de setembro de 2001, raciocina o economista, e a insensibilidade do presidente George W. Bush com a imigração alimentaram um antiamericanismo “ainda mais profundo do que nos anos 60”.

A “inteiramente previsível” guinada à esquerda confunde-se com a ascensão do populismo radical, que pode ser importante na Venezuela, nota o professor, onde Chávez distribui benesses aos amigos e dá paulada nos inimigo. Mas tem apelo limitado. Na visão de Bulmer-Thomas, o apoio do caudilho venezuelano pode prejudicar seus candidatos no México, no Equador e no Peru.

A petrodiplomacia de Chávez tem limites, argumenta o diretor da Chatham House: “Os pequenos países da América Central e do Caribe não vão trocar suas preferências no comércio com os EUA por petróleo barato.”

Com o barril de petróleo acima de US$ 50, a reeleição de Chávez em 5 de dezembro é praticamente certa. Nas outros países, a esquerda precisa cumprir suas promessas eleitorais.

Nos próximos anos, o cenário econômico internacional pode piorar. O pêndulo pode sair da esquerda.

Para o professor, a política externa brasileira está desarticulada. Terá de ser reformulada seja qual for o próximo presidente. A maneira “suave-suave” de lidar com Chávez e Morales deixou a política externa brasileira parecer tola e ineficiente.” Já se prepara uma postura de negociação mais dura.

A sobrevivência do Mercosul vai exigir uma grande liderança do Brasil. Bulmer-Thomas entende ainda que as relações com os EUA precisam “se acomodar” em questões que vão de comércio a segurança. E os EUA precisam dar mais atenção à negligenciada América Latina. Se isto for possível, conclui, talvez o antiamericanismo e o apelo do chavismo diminuam.

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